terça-feira, 26 de outubro de 2010

Capítulo 2

Próxima Sexta-Feira!

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Capítulo 1

27° Dia: Manhã

                                                           I

Julia olhava o horizonte com um olhar perdido. O sol começava a nascer. A estrada na sua frente se estendia por quilômetros em uma linha reta sem fim. Aquele era o sétimo carro que ela dirigia em menos de duas semanas. Ela se sentia segura ali. Mesmo sem nunca entender nada sobre carros, Julia sabia o básico. Aquele era um bom carro, disso ela tinha certeza. Rápido e espaçoso. E o mais importante: estava em boas condições. Havia uma boa quantidade de comida e água armazenada no porta malas. Além de combustível. Isso era essencial. Julia olhou para o banco do carona. Lá, enrolada em um cobertor laranja, dormia profundamente Lily. Apenas o rosto estava para fora. Seu rosto emanava paz. Julia suspirou. Passou a mão no cabelo incrivelmente preto de Lily. A  menina mexeu de leve e se acomodou no banco.O sol começa a sair mostrando que iria ser mais um dia de calor intenso.Julia pensou que mais um dia apenas estava preste a começar.Mais um dia.
Ela abriu a janela e deixou o ar frio da manhã entrar. Sentiu no seu rosto o vento. Seus cabelos,assim como o da filha de sete anos,eram negros de um tom extremamente escuro. Ela passou a mão sobre eles. Sentiu-os sujos e embaraçados. Suspirou. Ela nunca pensou que precisaria tanto usar seu xampu. E do condicionador. E da pasta de dente. Ela pensou que aquilo parecia uma coisa tão trivial, quase fútil, mas que agora parecia tão importante. Quem diria que em poucos dias sua vida mudaria tanto e tão rápido. Olhou novamente para a filha. Suspirou profundamente. Seus olhos encheram de lágrimas. Todo aquilo parecia um sonho. Sonho, não. Pesadelo. Um terrível pesadelo. O sol estava quase nascendo. Um toque leve no ombro de Julia a tirou de seus pensamentos.
            Dona Marta que dormia no banco de trás acabara de acordar. Com uma voz suave e meiga ela disse:
            -Minha filha, já era para eu estar dirigindo!Já está amanhecendo!Você deve estar morta de cansada!
            Julia a olhou pelo retrovisor e sorriu para a velha senhora.
            -Não quis acorda - lá. A senhora estava dormindo profundamente e eu não quis perturbá-la.
            Quem um dia poderia acreditar que aquela “velha” senhora seria de uma fibra tão forte. Julia agradecia pela presença dela ou de outra maneira ela e sua filha já estariam mortas. Aquela senhora, neta de escravos, viúva duas vezes e de uma simpatia e doçura tão grande poderia se mostrar uma pessoa de uma coragem e força que faria inveja e deixaria muitas meninas de vinte e poucos “no chinelo”. Enrolada em uma velha manta, com os óculos pendurados e com seu coque de cabelo sempre arrumado com perfeição, dona Marta se espreguiçou. Bocejou.
            -Vamos já é hora de você descansar!-mandou ela, mas sem perder a delicadeza - Você precisa descansar.
            -Não, eu estou bem. Gosto de dirigir.Me distrai!
            -Eu não pedi. Ordenei.-retrucou dona Marta sorrindo amavelmente.
            -Está bem!-retribuiu Julia com um sorriso.
            Julia parou o carro. As duas trocaram de lugares.Enquanto dona Marta dirigia o carro concentrada,Julia foi para o banco de trás.Mesmo não querendo pegou logo no sono.Antes de adormecer, ainda ouviu dona Marta exclamar que “aquele dia iria outro longo e calorento”.




                                                                          II
            Gritos. Pessoas correndo. Muito barulho. Os sonhos de Julia nos últimos dias eram basicamente os mesmos. Longos, torturantes e angustiantes. Imagens borradas eram apenas o que ela via. Mas o barulho era alto e bem nítido. Uma aflição crescia nela. Desespero. Medo. Ela sempre acordava de maneira brusca. Dessa vez não foi diferente.
            Quando abriu os olhos em um sobressalto, viu-se deitada no banco de trás enrolada em uma manta. Ela recobrou a consciência. Não, não era só um sonho. Ela indireto-se. Coçou os olhos. Colocou os pensamentos em ordem. O sol já estava alto e o dia lá fora parecia extremamente quente. O ar condicionado estava ligado o que deixava o interior do carro agradável. Dona Marta dirigia olhando fixamente a estrada. No banco do passageiro ela viu Lily se mexer. Logo a menina percebeu que Julia estava acordada.
            -Bom dia, mãe!-disse ela subindo no banco para olhar por cima.
            Julia olhou o rosto da filha e por alguns momentos se perdeu em pensamentos. Sorrindo de maneira tão terna e inocente, Julia pensou novamente que aquilo tudo não passava de um sonho. Rapidamente ela voltou à realidade e tomou seu papel de mãe.
-Lily, desce daí!Agora!
            A menina obedeceu. Julia se colocou entre os bancos e beijou o rosto da filha.
            -E bom dia, flor do dia!-disse sorrindo.
            Lily caiu na gargalhada. Ela estava segurando um pacote de bolachas e Julia pegou uma.
            -Bom dia, dona Marta!Que horas são?
            -Mais ou menos umas dez, dez e meia!
            -E senhorita comendo bolacha!?!-virou-se para Lily.
            A menina apenas deu uma risadinha e continuo a comer.
            Julia olhou em volta. A paisagem havia mudado um pouco. De uma estrada cercada por mata rasteira e baixa, agora era uma floresta densa e cheia de arvores.
            -Onde estamos?-indagou curiosa.
            -Não achei seguro seguir naquela estrada. -respondeu dona Marta-A próxima cidade estava muito longe. Vi essa entrada e a peguei. Tem uma cidadezinha não muito longe daqui. Se formos com cautela podemos achar algo lá.Ou alguém!
            Essa última parte veio cheia de significado. Ao mesmo tempo em que Julia queria encontrar alguém, tinha medo. Mas ela confiava nos instintos de dona Marta e não disse nada. Pouco depois ela se virou para a senhora e disse:
            -Precisamos parar um pouco. Tenho que fazer xixi!
Dona Marta diminui a velocidade e foi parando devagar no meio da pista mesmo. Julia foi abrindo a porta.
            -Lily, você quer ir?
            -Não. -respondeu a menina.
            -Certeza?Porque você adora fazer isso: fala que não quer e depois dá vontade quando não pode mais!
            -Sim, claro!-respondeu impaciente Lily.
            -Olha menina!-exclamou a mãe.
            Andando em direção a janela do motorista ela abaixou-se na direção de dona Marta.
            -Tudo bem com a senhora?Não precisa ir?
            -Não se preocupe comigo. Estou ótima. Minha filha tome cuidado!Essas coisas...
            -Não se preocupe!-interrompeu Julia - Eu sei me cuidar.
            Ela deu uma piscadela e foi em direção à floresta que se erguia em torno da estrada.
            Julia nunca esteve naquela região antes. Era uma floresta com arvores altas, arbustos densos e um chão coberto de folhas. Ela achou uma brecha e entrou, mas sem perder o contato com o carro. Ela olhou em volta. Nada se via a não ser a floresta que mais para frente ficava ainda mais fechada. Um aspecto sombrio e assustador. Julia desabotoou a calça jeans e se abaixou de leve. Depois de limpar-se com um pedaço de papel higiênico que tinha trazido. Vestiu a calça novamente e virou para ir embora. Lá estava o que mais levava pânico a ela nos últimos dias parado a poucos metros. Olhando-a fixamente.
            Ele era um homem alto. Enorme, para ser correto. Vestia um macacão jeans e por baixo uma camisa que parecia ser branca. Havia sangue por toda sua roupa. Vários dedos das mãos foram, aparentemente, decepados. Faltava uma parte da coxa esquerda. Mas não era aquilo que mais assustava. Uma parte enorme da sua cabeça simplesmente não mais existia. Julia conseguiu ver o seu cérebro dele. Um cheiro fétido de carne podre tomou conta do ar. Ela estava paralisada. Podia sentir o bafo dele muito perto. O cheiro de como se as portas do inferno tivessem sido abertas. Ele continuava a olhar fixamente com seu único olho. Uma expressão vazia e ao mesmo tempo assustadora. Ele bufou. Julia sabia o que exatamente aquilo que um dia já foi um ser vivo queria. O mais forte e antigo instinto que se tem conhecimento. O instinto de alimentar-se. De se manter vivo. Se vivo fosse a melhor expressão.
            Julia em um movimento rápido deu um pulo no exato momento que o mostro a atacou com seus longos braços. Mas não foi o bastante rápido o suficiente. Ele a pegou pelo pé direito. Os dois caíram. Com um animal feroz, ele começou a grunhir tentando capturar totalmente a sua presa. Julia começou a debater-se com força. Caída de frente ela conseguiu se virar e chutou com toda força a cabeça do mostro. Seu pé entrou pela matade do crânio dele. Ele berrou ainda mais. Ela conseguiu se levantar e tentou correr, mas escorregou devido a “gosma” que ficou no seu sapato. Foi o tempo necessário para o mostro levantar. Ali no chão, caída e sem defesa Julia viu o mostro pular na sua direção.
            Nesse momento um estampido alto foi ouvido e o mostro caiu, tombando para a direta. Julia estava tão apavorada que permaneceu imóvel com aquilo caído aos seus pés.
            -Mãe!
            A voz de Lily era estridente. De repente Julia sentiu a menina pulando em cima dela. Ainda meio sem reação ela abraçou Lily que chorava copiosamente. Como saída de um pesadelo ela voltou a si. Levantou rapidamente e tirou no colo Lily de perto do mostro. As duas se esconderam atrás de uma arvore.
            -Calma Lily!A mãe está bem!-Julia beijava o rosto da menina coberto de lágrimas-Calma, eu estou bem!
            Dona Marta surgiu um pouco mais na frente. Sua figura era ameaçadora com um rifle na mão apontando para o mostro caído no chão. Ainda saia uma fumaça da arma. Ela olhou em volta e viu as duas. Foi na direção delas.
            -Meu Deus, você está bem?-sua aparência agora era de preocupação e um pouco assustada.
            -Sim... Estou bem, sim. -Julia respondeu ofegante.
            -Temos que sair daqui agora!Aqui não é seguro!
            Julia respondeu afirmativamente com a cabeça. A velha senhora as ajudou a se levantarem do chão. Lily ainda chorava. Rapidamente elas saíram dali e foram em direção ao carro.